segunda-feira, 1 de junho de 2009

Uma ideia que quer se concretizar



Diletos professores Alfio, Jeanne, Leta e Vanessa,

Escrevo-lhes, pois sinto que devemos responder de maneira contumaz o pedido da Defensoria Pública Estadual sobre a questão do Pastinho. Não que estejamos de braços cruzados, mas penso que devemos aproveitar o fato.

A arquiteta e urbanista e professora da PUC-Rio, Ana Nobre, chama a atenção para a ausência de um ambiente de discussão em arquitetura em face dos inúmeros problemas que assolam atualmente a prática da arquitetura, como a falta de referências intelectuais e projetuais contemporâneas, o descolamento entre arte e arquitetura, a escassez de concursos públicos e a inexistência de um debate capaz de ganhar a esfera pública, que se traduz no assombroso silêncio profissional diante da falta de foco das operações cada vez mais midiáticas do Poder Público.

E prossegue afirmando que "preferimos seguir mecanicamente projetando e cultuando monumentos do que aceitar o desafio de Rem Koolhaas, para livrar-nos da eternidade historicamente associada à arquitetura e enfrentar os riscos que envolvem a sua prática hoje."

O desafio proposto por Koolhaas está no discurso que ele fez quando ganhou o Prêmio Pritzker, onde cito uma parte dele, pois seria uma perda falar com minhas palavras:

"A arquitetura não lidava com a maior diferença possível, mas sim com as sutilezas que poderiam ser desenvolvidas dentro de um estreito campo de semelhanças dentro da generalidade. Arquitetura era um continuum que terminava com o urbanismo. Uma casa era vista como uma pequena cidade. A cidade vista como uma imensa casa. Esse tipo de arquitetura enxergava-se como ideológica. Sua política abrangia todo o caminho entre o socialismo e o comunismo e todos os pontos intermediários. Grandes temas foram adotados para além da arquitetura, não a partir da imaginação individual da cabeça dos arquitetos. (...)

Nosso cliente não mais é o estado ou suas derivações, mas indivíduos privados frequentemente envolvidos em ambições arriscadas e trajetórias dispendiosas, que nós arquitetos apoiamos sinceramente.

O sistema é final. Nós trabalhamos numa era pós-ideológica e por falta de apoio nós abandonamos a cidade ou quaisquer outras questões gerais. Os temas que inventamos e sustentamos são nossas mitologias privadas, nossas especializações. Nós não temos discurso sobre organização territorial, nenhum discurso sobre povoamento ou co-existência humana. No máximo nosso trabalho brilhantemente investiga e explora uma série de condições singulares.

Um desenvolvimento é certo. Nos últimos três anos, brick and mortar evoluíram para click and mortar. O retail virou e-tail e não há como exagerar na importância destas coisas. Comparado ao brilho ocasional da arquitetura agora, o domínio do virtual afirma-se com abandono selvagem e confuso e está se proliferando numa velocidade que podemos apenas sonhar.

A menos que quebremos nossa dependência do real e reconheçamos a arquitetura como uma maneira de pensar sobre todos os assuntos, do mais político ao mais prático e liberar-nos da eternidade para especular sobre novas, atraentes e imediatas questões, como a pobreza, o desaparecimento da natureza, a arquitetura talvez não chegue ao ano 2050”.

Percebe-se que essas palavras, felizmente, não refletem mais o sentimento de uma classe - que sempre foi vista por muitos como utópica - e sim, refletem o sentimento da sociedade, que é explicitado pela clientela que procura o E.I. e pelo pedido da Defensoria Pública.

Dito isso e diante do papel limitado da minha ação dentro da escola (estudante e estagiário), tomo a liberdade de sugerir (mais uma vez) como resposta à Defensoria, que inicialmente e paralelamente a outras ações, organizemos um congresso, com publicação de trabalhos, sobre o tema carro chefe do Escritório de Integração e, hoje, mais que nunca, também do Curso de Arquitetura e Urbanismo da PUC: a organização territorial, povoamento e co-existência humana.

Abraços,

Marcão.

ps.: para saber um pouco mais sobre o caso, clique aqui.

---------------

Texto enviado por email aos Professores Jeanne Marie Ferreira Freitas, Coordenadora do Curso de Arquitetura e Urbanismo da PUC Minas; Vanessa Brasileiro, Coordenadora de Extensão DAU/PUC Minas; Alfio Conti e Margarete "Leta" de Araújo, Coordenadores do Escritório de Integração DAU/PUC Minas. O texto foi publicado por sugestão do Alfio Conti.

Nenhum comentário: