terça-feira, 30 de setembro de 2008

Os limites e os riscos da Assistencia Técnica Gratuita


Caro Marco também acho que com a assessoria técnica, ou assistência técnica gratuita (usarei as duas definições como sinônimos), se resolve somente uma parte do problema, a outra está ligada justamente à (in)capacidade técnico-construtiva da mão de obra presentes nestes lugares. Diria, mesmo correndo o risco de ser banal, que se a mão de obra existente, moradora destes lugares, fosse além de ser capaz, pois o espaço que ela constrói é um espaço que atende às necessidades delas, capacitada, além de construir um espaço tecnologicamente melhor, já teria conseguido emprego no setor da construção civil, pois hoje em dia é o setor que mais está à procura de mão de obra, sem, entretanto, conseguir satisfazer sua demanda.
Portanto, a meu ver, há de se associar sim, à assistência técnica, um programa de capacitação e formação de mão de obra, para que os moradores possam construir um espaço menos precário e mais econômico. Mais econômico pois o espaço construído das vilas e favela é extremamente caro do ponto de vista financeiro e social. Do ponto de vista financeiro por causa do processo de autoconstrução que se pauta em cima de um conhecimento pragmático que ainda não consolidou procedimentos e soluções tradicionais de construção afinadas e adaptadas ás condições ambientais do lugar (e é muito provável que isso nunca vai acontecer), resultando na adoção de soluções dispendiosas, oriundas da cultura construtiva que permeia nossa sociedade. Para dar um exemplo baste notar a profusão do uso do concreto armado para situações onde este poderia ser dispensado.
Do ponto de vista social porque, se os preciosos e parcos recursos utilizados para a construção fossem empregados utilizando soluções tecnológico-construtivas apropriadas, poderiam parte deles serem utilizados para outros fins, quem sabe até para o lazer e a educação.
Voltando ao programa de capacitação acho que deveriam ser procurados parceiros para fazer isso. Nós do Escritório de Integração podemos ser um deles já que fazemos isso a muito tempo, e uma universidade seria que pensasse à extensão como uma fonte de investimento na formação profissional dos seus alunos, poderia encarar isso com muita tranqüilidade.
Existe também um risco que a proposta da assessoria técnica gratuita levanta, assim como está formulada e que pode levar ao seu total fracasso. Para evitar que isso possa acontecer acho que deveria se investir mais na sua concepção respondendo às demandas: que tipo de assessoria técnica é essa e aonde utiliza-la? A ideia que permeia o meio institucional que promove esta proposta (que diga-se de passagem já constitui um avanço) é que o atendimento deva-se dar de maneira pontual, assim a ideia seria aquela de um banco de atendimento e é aqui que está o risco especialmente se isso for pensado para os assentamentos informais existentes nas grandes cidade. Se o objetivo é a melhoria também destes espaços como um todo, a utilização de atendimentos individuais e pulverizados, não irá trazer os beneficios esperados, mas muitas insatisfação, pois a abordagem, para ações de melhoria destes locais, deve ser de tipo sistêmico, para além da moradia incorporando a melhoria dos precários sistemas de mesoestruturas existentes (pavimentação, saneamento básico, etc.). Se a proposta continuar a se limitar à habitação estará fadada ao desastre. Pela conformação deste espaço, ainda tão incompreendido, vejam as soluções de intervenção adotadas pelo programa Vila Viva em Belo Horizonte que resolve derrubar o tecido existente e propor tipologias habitacionais alheias à experiencia de morar de quem vive na favela, são necessárias ações integradas e sistêmicas. Infelizmente a complexidade do espaço (no seu sentido mais amplo fisco, social e cultural) da favela ainda não é suficientemente objeto de analise, ou ainda a abordagem utilizada para sua compreensão é equivocada de tal maneira a propor soluções de intervenções que irão inevitavelmente se perder. Estou me delongando muito, mas esta ultima parte explica porque o Escritório de Integração tanto criticou a proposta institucional da Arquitetura e Engenharia Pública, pois esta concebia o mesmo tipo de intervenções que estão previstas na assistência técnica gratuita. Acho que uma proposta dessa pode valer para certas periferias onde há a individualização da propriedade e onde existem mesoestruturas que funcionam, penso principalmente as periferias das cidades médias, mas para os assentamentos informais das grande cidades e das metrópoles ela deve ser necessariamente repensada, ao não ser que se pretenda trabalhar unicamente com o espaço do morar individual, esquecendo, ou não querendo ver que este compõe um espaço maior, enfim, esquecendo, ou não querendo ver que existe uma cidade.
Alfio Conti

Nenhum comentário: