quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Universalizar o mutirão é universalizar o desemprego

"'Universalizar o mutirão é universalizar o desemprego. Como política pública, o mutirão é uma solução como pintar de verde e amarelo as favelas do Brasil'. Com estas frases, o sociólogo Francisco Oiveira (USP) sintetizou seu discurso diante de uma platéia estarrecida no seminário "Políticas habitacionais, produção de moradia por mutirão e processos autogestionários: balanço crítico de experiências em São Paulo, Belo Horizonte e Fortaleza", nesta segunda-feira, na Cidade Universitária.

Segundo Oliveira, o sistema de mutirão supõe que os participantes estejam desocupados. Assim, sua adoção como política pública teria um impacto no desemprego e tenderia a eternizar a má distribuição de renda no país. Mesmo após a intervenção de vários arquitetos que trabalham com mutirões há anos, o sociólogo manteve suas afirmações e as apoiou em dados de pesquisas de grupos da própria universidade.

"A industrialização do Brasil se fez sustentada na auto-construção, por um lado, e no investimento estatal, por outro", raciocinou. "Com isso, o custo da habitação quase desaparece. Com o salário mínimo sendo calculado em valor de subsistência da família típica, esse investimento não contava. Aí há uma transferência de renda por meio do rebaixamento do salário. Então esses modelos de financiamento da habitação agravaram a situação do trabalho". O sociólogo ligou a questão da habitação intimamente ao problema do trabalho: "Nas classes populares não existe mercado imobiliário. O imóvel não é mercadoria, só tem valor de uso. Por outro lado, as famílias abaixo da linha da pobreza, na maior parte desempregada, é que gastam seu tempo no mutirão. Para funcionar como política pública, a auto-construção exige que todos estejam desempregados". Oliveira criticou ainda o tipo de relações sociais criadas pelo mutirão.

Ele afirma que nos mutirões das políticas públicas, ao contrário dos mutirões tradicionais, é preciso que haja coerção para a criação de uma comunidade artificial. "Não há identidade entre estas pessoas, porque a precariedade da situação delas não plasma nenhuma experiência coletiva. Uma liderança de Santa Maria Gorete, em Fortaleza, me disse que é preciso coagir para haver unidade e funcionalidade. Isso não é formação de cidadania, está no pólo oposto", disparou.

Na análise de Oliveira, quando termina a construção do mutirão, a carência cessa e a coesão artificial desaparece, mas o desemprego e a baixa renda continuam, deixando espaço para a violência. A solução, para o sociólogo, consiste em endereçar a construção da habitação por seu caráter de mercadoria. "Uma solução seria o empréstimo - todo crédito é um adiantamento sobre renda futura. Só o empréstimo a custo zero distribuiria a renda no Brasil. Eu aconselharia pegar os recursos do Fome Zero e subsidiar a Caixa Econômica para que ela desse empréstimos a juro zero", provocou."

Fonte: http://www.reportersocial.com.br/

Um comentário:

Alfio Conti disse...

Mesmo não concordando com os argumentos dele acredito na boa fé do sociologo. Sugiro por parte dele uma analise mais aprofundada do que é mutirão autogestionário. Estou ciente que o mutirão autogestionário precisa de mais aprimoramento e, nesse sentido seria benvinda a contribuição por parte destes profissionais, pois concordo que o aspecto organizacional e comunitário ainda precisa ser trabalhado para encontrar meios para que o mutirão em autogestão possa ir além da simles produção das moradias, tornando-se uma maneira de encarar os desafios urbanos por parte de uma comunidade organizada e capaz de se autodeterminar.